A origem da Teoria do Risco da Empresa
A responsabilidade civil objetiva na relação de consumo possui como fundamento a teoria do risco. Por esse motivo, a análise do advento e aplicabilidade desta teoria se torna não só necessária, como inevitável.
A teoria do risco surgiu no final do século XIX na França, sendo concebida como uma probabilidade de dano, isto é, aquele que exercesse uma atividade perigosa deveria assumir os riscos e reparar o dano dela decorrente.
A partir daí a teoria do risco pôde ser observada na seara consumerista, como em tantos outros campos do direito. Tornou-se presente em diversas legislações, tais como a Constituição Federal, Código Civil, Código de Mineração, Código Brasileiro de Aeronáutica e legislação ambiental. (CAVALIERI FILHO, 2008)
Diante da exposição das múltiplas facetas e naturezas jurídicas da teoria do risco, nota-se a sua incomensurável riqueza e relevância no mundo jurídico. Por outro lado, em sede de direito do consumidor, é possível considerar a teoria do risco como fator influenciador na constatação do dever jurídico de indenizar dos fornecedores de produtos nos acidentes de consumo.
Os fundamentos da teoria do risco no Direito do Consumidor
Se antes havia a necessidade de as empresas assumirem os riscos da sua atividade, agora a necessidade se amplia dadas as modificações sensíveis nos produtos e serviços.
A sociedade de consumo sofre com oferta e exposição em massa de produtos e serviços dotados de alta complexidade tecnológica, quase sempre sujeitos aos defeitos de diversas naturezas, por óbvio, os acidentes de consumo ocorrem até com certa naturalidade e freqüência. (BENJAMIN, 2009)
Neste sentido, a avaliação dos riscos que a atividade empresarial provoca aos consumidores não só se torna perfeitamente possível, como necessária. A possibilidade de avaliação e análise dos riscos da atividade empresarial é perfeitamente cabível diante da evolução tecnológica.
Portanto, aquele que se dispõe a exercer alguma atividade no mercado de consumo tem o dever de responder pelos eventuais vícios ou defeitos nos bens e serviços fornecidos, independentemente de culpa. (CAVALIERI FILHO, 2008)
Noutro giro, ainda se fundamenta a teoria do risco com base na confiança, elemento indispensável nas relações de consumo e que é esculpido no próprio Código de Defesa do Consumidor (art.14 § 1º). Neste mesmo sentido, cita-se a lições de Larenz:
Aquele que criou o estado de confiança está mais próximo de suportar os riscos resultantes de uma indução ou erro ou – no caso de documentos – de um uso indevido em relação àquele em que há de confiar. O princípio da confiança, com base de uma responsabilidade pela confiança, é só uma de entre várias configurações deste princípio. Está contido como elemento coenvolvido no princípio da boa-fé, onde, por sua vez, encontrou uma expressão especial nas doutrinas da caducidade, e na proibição de venire contra factum proprium. (LARENZ, 1997, p. 678)
Ainda se enumera os seguintes fundamentos de apoio à teoria do risco:
A) A necessidade de proteção das vítimas do evento danoso diante da brutalidade dos fatos da vida;
B) A dificuldade em se apurar o elemento culpa, quase sempre vago, impreciso e incerto;
C) A indispensabilidade do tratamento desigual para partes naturalmente desiguais, ou seja, consumidor e fornecedor de produtos, com a finalidade de elevar os mais nobres princípios de justiça e equidade;
D) A evolução no sistema de apuração de responsabilidade, em termos de certeza, segurança e estabilidade jurídica. (LIMA, 1998)
Contraponto à Teoria do Risco da Empresa
Em posição contrária à teoria do risco, apresenta-se o argumento de que a mesma imprime demasiada atenção à vítima do acidente de consumo. Tal aspecto, em tese, negaria o princípio da justiça social, para impor o dever de reparar o dano no acidente de consumo de forma desproporcional.
Ainda em resistência à teoria do risco, há quem afirme que mesma é capaz de inviabilizar a atividade econômica e, por esse motivo, seria inaplicável. (DIAS, 1997)
Entretanto, o argumento exposto perde razão e credibilidade em uma análise mais pragmática, posto que, os fatos danosos são de ocorrência excepcional, tanto que a aplicação da doutrina do risco foi ampliada sem sinal algum de prejuízo ao desenvolvimento econômico.
A ausência de prejuízo ao desenvolvimento econômico, deve-se ao fato que as grandes empresas consideram os riscos como uma condição de atividade econômica que exercem e os fazem figurar no seu próprio passivo. (LIMA, 1998)
Assim, pode-se aferir que a teoria do risco constitui um avanço no campo de apuração da responsabilidade dos fornecedores de produtos, vez que se baseia na posição de superioridade da empresa/empresário em face dos consumidores, nos riscos que submetem a sociedade de consumo e na expectativa legítima que geram nos consumidores.
Dessa maneira, diante destes fatores, o dever de assumir os riscos da atividade econômica, sejam eles diretos ou indiretos, impõe-se de forma necessária nas relações de consumo. (CAVALIERI FILHO, 2008).
Referências
BENJAMIN, Antônio Herman V. Manual de Direito do Consumidor. 2ª Ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009
BRASIL. Lei nº. 8.078, de 11 de setembro de 1990. Estabelece o Código de Defesa do Consumidor. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 12 set. 1990.
CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 8ª ed.. São Paulo: Atlas, 2008.
DIAS, José Aguiar. Da Responsabilidade Civil, Vol. I. Rio de Janeiro: Forense, 1997.
LARENZ, Karl. Metodologia da Ciência do Direito. 3ª ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1997
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Como Citar este artigo:
Meira, Hugo Vinícius Muniz. Teoria do risco da empresa no Direito do Consumidor. Hugo Meira | Advogado, 2020. Disponível em:
<https://www.hugomeira.com.br/2020/01/teoria-do-risco-da-empresa.html>
Acesso em: (dia), (mês) e (ano).