Princípio da Qualidade e da Confiança no Direito do Consumidor

Princípio da Qualidade no Direito do Consumidor

O princípio da qualidade do produto é um dever jurídico ideal, trata-se de um dos pilares da responsabilidade objetiva traçada na legislação consumerista. É o que as lições de Benjamin ensinam:
“A teoria da qualidade forma-se com os olhos voltados para o instituto da responsabilidade do fornecedor: civil, administrativa e penal. De nada adiantaria criar-se um dever de qualidade se o seu desrespeito não trouxesse conseqüências para o violador. Tanto no direito administrativo como no direito penal, a teoria da qualidade apresenta um colorido predominantemente repressivo. Já pelo prisma da responsabilidade civil, o tom principal é dado pela reparação, elemento essencial para o consumidor lesado. É em tal sede, portanto, que a questão da qualidade ganha enorme importância econômica.” (BENJAMIN, 2009, p. 111)
Se após a ocorrência do acidente de consumo incide a teoria do risco, assegurando de certa forma a reparação dos danos ao consumidor, em uma fase muito anterior ao acidente de consumo, até mesmo antes da comercialização do próprio produto, apresenta-se à empresa ou ao empresário o dever de imprimir segurança e qualidade aos seus produtos. (MARQUES, 2009)

Dessa maneira, a teoria do produto ideal ou princípio da qualidade do produto consiste no dever legal de fornecer produtos e serviços capazes não só de cumprir suas funções e finalidades, mas também de assegurar qualidade e segurança, valores exigidos legitimamente pela sociedade de consumo. (BENJAMIN, 2009)

Por outro lado, ressalta-se que o princípio da qualidade do produto não é irrestrita e comporta mensuração e proporcionalidade na apuração da responsabilidade do fornecedor de produtos, isso porque o Código de Defesa do Consumidor primou pela garantia de segurança do produto ou serviço de forma limitada, como apregoa o§ 1º do art.12 do CDC, à “segurança que dele legitimamente se espera”.

Não se trata de uma segurança absoluta, mesmo porque o CDC não desconhece ou proíbe que produtos naturalmente perigosos sejam colocados no mercado de consumo, pelo contrário, concentra-se na idéia de defeito, de falha na segurança e qualidade. (MIRAGEM, 2003)

Princípio da Confiança e da Boa-Fé nas Relações de Consumo

Mais uma vez, aponta-se a os elementos confiança e boa-fé como norteadores das relações de consumo. Se estes elementos são capazes de fundamentar a teoria do risco, o mesmo ocorre na teoria do produto ideal. Neste exato sentido, leciona Dias:
“Seu sistema considera que somos responsáveis para com os outros na medida em que eles têm a necessidade de confiar em nós mesmos, não somos perante outrem; a relação de que nasce a responsabilidade é uma relação de confiança necessária; a obrigação que ela cria é uma obrigação que gera a confiança e, quando essa obrigação não é executada, quando há confiança legítima enganada, há culpa. (DIAS, 1997, p. 65)”
Ainda que pese o conhecimento da impossibilidade de um determinado produto atingir os resultados que dele se espera, deve o fornecedor de produtos se responsabilizar pela quebra de expectativa legítima do consumidor. Tal entendimento visa compensar ou aos menos amenizar a quebra de expectativa ou confiança do consumidor que jamais iria adquirir um produto sabidamente defeituoso ou apto a lhe causar danos. (BENJAMIN, 2009)

A fundamentação na confiança e expectativa dos consumidores acerca do bem ou produto adquirido pode ser facilmente demonstrada através de exemplos práticos. Outrora, pertences de estimável valor eram guardados em residências comuns, havia até hábito folclórico de guardar economias em espécie nos colchões. Entretanto, com o surgimento das instituições financeiras e respectivos serviços, o citado hábito perdeu completo sentido e conveniência.

Tal transformação só ocorreu em virtude do elemento confiança, isso porque, no âmago dos consumidores existia o senso de certeza de que o patrimônio em posse dos bancos estaria completamente assegurado. Este mesmo senso de certeza e segurança acompanha os consumidores que deixam seus veículos nos estacionamentos dos Shoppings ou que ainda adentram em qualquer estabelecimento comercial.

Conclusão

Dessa maneira, a teoria do produto ideal ou princípio de qualidade do produto, bem como o princípio da confiança serviram de base jurídica para elaboração das normas de consumo, e também servem à aplicação do direito, na apuração da responsabilidade do fornecedor de produtos nos acidentes de consumo, sob duas óticas:

A) Garantia da incolumidade físico-psíquica do consumidor e proteção a saúde, segurança e vida;

B) Garantia da incolumidade econômica e patrimonial.

Referências

BENJAMIN, Antônio Herman V. Manual de Direito do Consumidor. 2ª Ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009

DIAS, José Aguiar. Da Responsabilidade Civil, Vol. I. Rio de Janeiro: Forense, 1997.

MARQUES, Claudia Lima. Manual de Direito do Consumidor. 2ª Ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009

MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. 1ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003

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Como Citar este artigo: 

Meira, Hugo Vinícius Muniz. Princípio da Qualidade e da Confiança no Direito do Consumidor. Hugo Meira | Advogado, 2020. Disponível em:
<https://www.hugomeira.com.br/2020/01/principio-da-qualidade-e-da-confianca.html>
Acesso em: (dia), (mês) e (ano).